As passagens dos ônibus municipais, trens da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e metrôs, em São Paulo, aumentaram de R$ 4,30 para R$ 4,40 no primeiro dia de 2020. O reajuste de R$ 0,10 já havia sido decidido, no final de dezembro, pelo prefeito da capital paulista, Bruno Covas, e pelo governador do estado, João Doria.
O sistema municipal de ônibus é responsabilidade da prefeitura, enquanto o metrô e os trens ficam a cargo do governo de São Paulo. Ambas as administrações são, atualmente, comandadas pelo PSDB.
O aumento, de 2,33%, ficou abaixo da inflação anual. O acumulado de 12 meses do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), foi de 3,27% até novembro de 2019. Se o reajuste tivesse seguido esse índice, as passagens teriam que custar R$ 4,44.
Na nota conjunta em que justificam a mudança, a prefeitura e o governo usaram a previsão de inflação do ano, de 3,86%, do boletim Focus, divulgado pelo Banco Central. Neste caso, o preço iria para R$ 4,47.
8,3 milhões de pessoas usam diariamente as 13 linhas dos trens da CPTM e do metrô, segundo o governo do estado
8,8 milhões de passageiros utilizam, por dia, os ônibus da capital, de acordo com a prefeitura
O reajuste para a tarifa integrada, que permite ao usuário pegar trem ou metrô e, na sequência, ônibus, foi de 2,27% (de R$ 7,48 para R$ 7,65).
Para 2020, a Prefeitura de São Paulo prevê um subsídio para o transporte público de R$ 2 bilhões, ante os R$ 3 bilhões gastos em 2019. A administração municipal subsidia as empresas privadas de ônibus que fornecem o serviço para cobrir os benefícios oferecidos aos passageiros, como o passe livre para idosos, a meia tarifa para estudantes e o bilhete único, que dá o direito a qualquer pessoa com o cartão embarcar em dois ônibus no período de três horas pagando uma tarifa.
AS REAÇÕES AO AUMENTO
Ainda em dezembro, com o anúncio de que as passagens subiriam, o Instituto de Defesa do Consumidor enviou uma carta ao prefeito Bruno Covas pedindo para que ele desistisse do reajuste, alegando que a medida tem um impacto grande para os usuários.
Segundo a entidade, a prefeitura poderia manter o valor em R$ 4,30 ao reajustar apenas o valor do subsídio, ou seja, pagando mais para as empresas que prestam o serviço. O instituto disse ainda que o sistema de transporte não é gerenciado de maneira eficiente.
O Movimento Passe Livre, que ficou nacionalmente conhecido em 2013, ao liderar as manifestações contra o aumento na tarifa do ônibus na capital paulista, marcou um ato contra o novo reajuste para 7 de janeiro, a partir das 17h, em frente à Prefeitura de São Paulo. Com a pressão das ruas em 2013, que deram início a protestos em todo o Brasil, o aumento de R$ 3 para R$ 3,20 foi revogado. Desde então, manifestações não surtiram o mesmo efeito e a tarifa vem sendo reajustada.
QUEM É MAIS PREJUDICADO PELO REAJUSTE
Dados da mais recente pesquisa Origem e Destino do Metrô, de 2017, mostram que 72% dos usuários de ônibus na região metropolitana de São Paulo e 56% dos usuários do metrô possuem renda familiar mensal nas duas faixas mais baixas aferidas pela pesquisa (a faixa 1 vai até R$ 1.908 e a faixa 2 varia de R$ 1.908 a R$ 3.816). O uso do transporte coletivo diminui quanto maior a renda do usuário.
Os pesquisadores entrevistaram moradores de 32 mil domicílios. Ao analisar 342 zonas na cidade de São Paulo, a pesquisa perguntou aos entrevistados por que razão eles escolhem viajar a pé. Entre todos os respondentes, 3% dizem que deixam de pegar transporte público por causa do valor da passagem.
Em regiões periféricas, no entanto, esse número é maior. Em Heliópolis, de cada dez pessoas, três dizem que vão a pé para o trabalho ou para a escola por causa do preço da passagem. É a região da cidade com a maior proporção de pessoas que desistem do transporte público por causa do preço.
Ao jornal Agora SP, moradores disseram caminhar 3,5 km para chegar ao trabalho como forma de economizar o dinheiro do transporte para conseguir pagar o aluguel. Estudantes também andam por 40 minutos até a escola.
Em Heliópolis, 14.567 pessoas responderam que preferem andar por causa do valor do transporte público. Outros 3.057 disseram que andam a pé por causa da demora dos ônibus. No bairro, 81% dos entrevistados possuem renda familiar nas duas faixas mais baixas (até R$ 3.816).
Em comparação, menos de 1% dos entrevistados em Higienópolis, na região central, ou em Pinheiros, na zona oeste, disseram que não pegam transporte público por causa do preço das passagens.
Maior comunidade de São Paulo, localizada na zona sul, no distrito de Sacomã, Heliópolis fica a cerca de 8 km do centro da cidade e possui quase 200 mil habitantes. A dificuldade na região é grande até para usar serviços de transporte individual como o Uber, já que a maioria dos motorista se recusa a acessar a favela devido ao estigma de violência no local. A empresa lançou uma iniciativa em abril de 2019 para incentivar o serviço no distrito, espalhando cartazes e painéis. O Uber definiu quatro pontos de embarque a distâncias de 350 a 800 metros, no entorno da favela.
As regiões da Vila Carioca e Moinho Velho, vizinhas de Heliópolis, numa área que faz divisa com o ABC Paulista, também estão entre as que os moradores mais andam a pé por causa do preço do transporte público. Lá, uma em cada cinco pessoas prefere caminhar por causa do preço da tarifa.
O PESO DO TRANSPORTE NA RENDA FAMILIAR
Um levantamento do jornal O Estado de S.Paulo, divulgado em janeiro de 2019, quando a passagem custava R$ 4,20, mostrou que usuários que precisavam tomar ônibus e metrô ou trem, ou seja, comprava a tarifa de integração, gastavam um terço de um salário mínimo apenas para ir e voltar do trabalho.
Em 2020, o salário mínimo foi reajustado para R$ 1.039. Quem depende de apenas uma modalidade de transporte neste ano em São Paulo gastará por mês 18,6% de um salário mínimo. Já quem precisa fazer integração vai comprometer, mensalmente, 32% de um salário mínimo com a locomoção.