Enfim, o que é Superávit?

A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) publica constantemente a situação econômica, fiscal e financeira dos entes subnacionais (Estados e municípios). No caso do Acre, apareceu um superávit irrisório de pouco mais de R$ 40 milhões de reais em 2017. O parco valor foi objeto de comentários nos meios jornalísticos favoráveis e desfavoráveis ao governo local. Mas afinal, o que é superávit? O Dicionário prático de língua portuguesa (1997) afirma que é a “Diferença a mais entre a receita e a despesa; saldo a favor.” Superávit ocorre quando a receita é maior que a despesa, sobrando dinheiro no caixa, na conta corrente, no ‘contracheque’ ou na conta do Tesouro Estadual. O superávit não é exclusivo do governo, também faz parte das pessoas físicas e/ou jurídicas.

A pessoa jurídica quando possui receita maior que a despesa passa a ter lucro, sendo o contrário, mais despesa do que receita, prejuízo. Quando o ente público tem prejuízo chamamos de déficit. Então, superávit e lucro são as mesmas coisas para pessoas diversas, ocorrendo o mesmo com o déficit e o prejuízo. O que se observa entre ambos são as exigências técnicas que regem o sistema público. O especialista em Finanças Públicas e Doutorando em Ciências Empresariais, Professor Ernesto José da Silva, afirma que “lucro é utilizado nas entidades com finalidade lucrativa, enquanto que naquelas que não visam o lucro, como é o caso das entidades públicas, é utilizado o termo superávit, para evidenciar a situação positiva apurada.”

Diversos são os tipos de superávits: orçamentário, patrimonial, financeiro, primário e nominal. Não vamos falar de todos, apenas dos dois últimos. Superávit primário ocorre quando o ente público possui mais receita que despesa, sem contar a dívida, ou seja, sem incluir na despesa a conta com juros da dívida e a própria dívida, restando saldo positivo. Superávit nominal ocorre quando no cálculo são incluídos os juros da dívida e a própria dívida (principal), ou seja, é toda a receita menos a despesa, restando saldo positivo. Assim, quanto maior for o superávit primário, maior será a capacidade do governo de pagar os juros da dívida e o principal, gerando superávit nominal. O professor Ernesto diz que “Um dos intuitos marcantes da Lei Fiscal e desejo do Fundo Monetário Internacional (FMI) é fazer com que o superávit primário abata a dívida pública.”

O Brasil no passado recorreu muito ao FMI para quitar sua dívida externa e melhorar as finanças públicas. Hoje, a situação possui certa tranquilidade fiscal e financeira como demonstrou a STN na semana passada ao afirmar que detém um colchão de liquidez para pagar títulos públicos de R$647,4 bilhões de reais, de US$381,6 bilhões de dólares em reservas internacionais e de R$9 bilhões de reais em caixa para bancar o pagamento de todos os vencimentos da dívida externa nos próximos 12 meses. Uma situação bem confortável para enfrentar a crise vindoura com o aumento dos juros dos títulos públicos americanos pelo Federal Reserva (banco central americano).

Nas duas últimas semanas a valorização do dólar frente ao real chegou a R$3,60. A desvalorização do real ocorreu mais por fatores externos do que internos (ainda), mas com a proximidade da eleição presidencial e a ausência de um candidato reformista, a tendência será a junção dos fatores internos e externos, exigindo da STN e do Banco Central do Brasil (BCB) a modificação de rumo a fim de estancar qualquer ataque à economia nacional. O BCB já começou a modificar sua orientação quanto ao swap cambial, evitando a continuidade da desvalorização do real e impedindo o aumento da inflação no futuro e a elevação da taxa Selic.

O desequilíbrio fiscal pode ser devastador para a economia nacional e o exemplo é a Argentina que enfrentou nas duas últimas semanas uma fuga de capitais, levando o Banco Central a subir os juros para 40% a fim de evitar a dilapidação de suas reservas internacionais.

Voltando ao Acre e ao superávit relatado pela STN, entendemos que isso não quer dizer que estamos em situação melhor do que os demais entes públicos. Estudo da STN também demonstrou que estamos pagando 9% de nossas receitas com dívidas (juros e o principal), e que a despesa com pessoal supera o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal, fatores preocupantes. O Estado do Acre depende mais de 50% das transferências correntes enviadas pelo governo federal como mostrou estudo da STN, demonstrando, mais uma vez, a nossa incapacidade de geração de riqueza por falta de uma política econômica de industrialização e de empreendedorismo, de uma desburocratização das questões fiscais e de um aperfeiçoamento da máquina de arrecadação que é a Sefaz em prol do desenvolvimento estadual. Quanto ao pagamento da dívida estadual já solicitamos por duas vezes ao Secretário da Fazenda cópias dos contratos de empréstimos (nacionais e internacionais), sendo que sequer tivemos direito a resposta, seja qual for.

Ter superávit ou lucro é simples, vejamos um exemplo: João ou o Acre possui uma receita mensal de R$2 mil reais e uma despesa de R$2.100,00. Acontece que o valor da energia é de R$150,00 e pode ser paga fora do prazo, ou seja, pode ser ‘empuxada’ para o mês seguinte. Então, se João ou o Acre deixa de pagar no mês corrente a energia para pagar no mês seguinte, temos que no encerramento do mês existiu um superávit ou lucro de R$50,00 (2.100,00-150,00=1.950,00 // 2.000,00-1.950,00=+50,00). Simples assim, basta ficar ‘empuxando’ certa despesa. Agora, superávit ou lucro verdadeiro ocorre quando a receita é de R$2.200,00 e a despesa de R$2.100,00, resultando no saldo positivo de R$100,00.

Portanto, o superávit estadual em 2017 pode ter ocorrido por uma simples redução no pagamento dos fornecedores, dos terceirizados ou até mesmo da ausência de investimentos. Não enxergo o que comemorar com um superávit que sequer chega a 1% da Lei Orçamentária Anual de 2017 do Acre (Lei n. 3.205/2016). Enfim, se o governo estadual continuar sonegando as informações solicitadas, estaremos sempre sem saber o quanto devemos e por quanto tempo iremos arcar com o pagamento dos juros e do principal dos diversos empréstimos feitos nos últimos 20 anos, bem como a formação do superávit, levando-se em consideração a visão dos demais dados.


Marco Antonio Mourão de Oliveira, 42, é advogado, especialista em Direito Tributário pela Universidade de Uberaba-MG e Finanças pela Fundação Dom Cabral-MG; presidente da Comissão de Finanças Públicas e Orçamento Público da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Acre.