Qualquer afirmação, para ser feita, seja sobre qual assunto for passa, certamente, pela confirmação de uma hipótese. Já a formatação dessa se baseia, fundamentalmente, em premissas, o que em poucas palavras são, requisitos que permitem a estruturação de um raciocínio. Elas, as premissas, podem ser explícitas, quando estão claramente descritas em regras, regulamentações e/ou procedimentos corporativos, ou tácitas, ao permanecerem apenas no intelecto das pessoas e empresas de maneira implícita, de tão óbvias sequer precisam serem escritas, o que, justamente as diferenciam das explícitas. O mundo corporativo é estruturado por uma série dessas premissas sem as quais, a hipótese de suas existências se desfaz.
Na última semana, veio a publico o fato da empresa multinacional Salesforce ter demitido ao menos três funcionários de sua unidade no Brasil. O motivo veio à tona a partir de denúncia de um colaborador sobre uma festa à fantasia promovida na empresa ao final do ano passado. Nesta oportunidade, um funcionário se fantasiou de “Negão do Whatsapp” com exposição de certo utensílio que se assemelhava a um grande órgão genital masculino. Segundo versão, a matriz teria, inicialmente, solicitado a demissão desse funcionário. Diante a suposta recusa de seu diretor, sob a alegação que era apenas uma brincadeira, este também teve sua demissão pedida. Ao sinalizar que não aceitaria as demissões, o próprio presidente da filial brasileira foi demitido.
Lembrei algumas verdades que têm permeado minha vida profissional, desde sempre:
· A empatia, o ato de se colocar no lugar do outro, deve basear qualquer relação humana, já no mundo corporativo, isto é mais que obrigatório;
· A amizade entre colaboradores é algo importante, que pode, até mesmo, ser estimulada, principalmente em prol de um bom clima organizacional;
· A nossa liberdade termina quando começa a do outro;
· Não se pode constranger quem quer que seja, ainda mais por questões de cunho sexual, religioso, político, enfim, de qualquer natureza;
· O respeito é o ar a ser respirado.
Ops, me permita corrigir, estas estão presentes na vida de qualquer profissional.
Respeito muito as opiniões de terceiros, mas no meu entendimento é inacreditavelmente doloroso evidenciar a presença de colaboradores que tenham reprovado a decisão tomada pelo corpo diretivo da Salesforce em sua matriz. Apenas a falta de noção plena que aflige tantos colaboradores em nosso país pode entender como ‘apenas uma brincadeira’ a cena de um funcionário com trajes carregados de forte apelo sexual, durante um evento corporativo, que é a festa de final de ano de uma empresa. É inimaginável o constrangimento a qual tantos foram submetidos, sem qualquer consulta prévia que permitissem evitá-lo, por conta de um ato cabível apenas entre rodas de amigos íntimos que tenham total ciência sobre esta situação. E olha que sequer estou sinalizando a questão da associação disso com a marca da empresa, algo sagrado.
Ainda que os profissionais envolvidos, possam, eventualmente, terem propiciado ao longo de suas carreiras, ótimos ganhos para as empresas onde já atuaram, é inapelavelmente chocante que nenhum deles, ao que parecem, tenham aprendido o básico. Lembro quando, alguns anos atrás, em uma empresa onde atuei, um rapaz foi demitido ao mandar um e-mail para todos os funcionários, oferecendo serviços como freelance para, segundo ele, “ajudar nas contas em casa”, uma vez que seu salário era “baixo”. Ao pedir desculpa ao seu diretor e usar como um dos argumentos o fato de não saber que isto era proibido, este o respondeu: “… está desculpado, mas lamento muito por você não ter ainda trazido para si regras tão básicas de comportamento. Isto não se aprende na ‘escola’, mas vivendo. Desejo que você ainda tenha disposição para aprender, afinal sempre temos, se quisermos”.
José Renato Sátiro Santiago Junior é historiador do futebol e autor de vários livros. Também atua como consultor de empresas na área gestão de projetos e do conhecimento.