No AC, estudante de pedagogia que perdeu a visão aos 17 anos aprende Libras por meio do tato

Stefhanie Vidal decidiu encarar o desafio, se apaixonou pela língua e pensa em fazer curso para aprender mais. Jovem tinha aulas de até 4 horas com a ajuda de intérprete da Ufac

Através do tato, a estudante de pedagogia Stefhanie Vidal conseguiu superar o desafio de aprender a Língua Brasileira de Sinais (Libras). A língua é uma disciplina obrigatória no 4º período do curso na Universidade Federal do Acre (Ufac). Apesar das dificuldades, Stefhanie não pensou duas vezes antes de encarar o desafio de aprender uma língua visual mesmo sem enxergar.

“Antes de começar o curso eu não tinha noção de que poderia aprender. Mas, sempre tive curiosidade de aprender Libras, apesar de mesmo após esse processo eu achar ainda bem difícil. Foi durante o curso de pedagogia que descobri que existia uma forma de aprender Libras, que no caso é a Libras tátil, justamente por existir surdos que são cegos. Então, não é impossível”, conta.

A jovem ficou cega aos 17 anos depois que um coágulo na cabeça atingiu o nervo ótico. Ela chegou a iniciar os cursos de história e inglês, mas acabou não concluindo. Com a ajuda do intérprete João Xavier, do Núcleo de Apoio à Inclusão (NAI), a estudante começou as aulas de Libras que duravam e média quatro horas.

“Era um pouco cansativo, pois na Libras tátil eu preciso estar com o braço um pouco levantado para acompanhar os gestos que o intérprete faz com as mãos. Então, se torna cansativo por causa da postura, pois preciso estar de frente para quem está falando comigo. Mas, em nenhum momento pensei em desistir, de forma nenhuma”, afirma.

‘Aprendia rápido’, diz intérprete

Xavier acompanhou Stefhanie em todo o processo e conta que o grande desafio era que a aluna cursasse uma disciplina visual sem enxergar. Ele explica que durante as aulas de Libras tátil ele fazia o sinal, a aluna sentia e entendia o significado, pois já conhecia a configuração da mão.

“Esse foi o primeiro na universidade com a presença de um intérprete. Toda a aula a gente tentava uma estratégia nova para passar tudo para ela da forma melhor. Com os dias fomos percebendo que ela estava gostando de aprender Libras e aprendia rápido, então, a aula era de 13h30 às 17h e parecia que passava em minutos porque ela estava feliz”, relata.

Para auxiliar ainda mais, Xavier começou a pesquisar outros casos e fazer contato com outros amigos intérpretes para pegar dicas. Ele destaca que houve um trabalho em equipe a começar pela professora que pediu auxílio para que a estudante não desistisse das aulas, além dos revisores de braile que faziam a adaptação das apostilas para a Stephanie.

“Toda aula a gente via algo novo. Aprendemos que não podia usar cadeira com braços, que tinha de ser sem braço para ela poder fazer os movimentos, algumas estratégias de toque e também de como falar com ela. Até a entonação quando ela errava eu não podia dar aquela respirada funda para que ela percebesse, foi preciso uma postura diferente para que ela se sentisse confiante e apta”, ressalta.

O método usado pelo intérprete funcionou, já que a estudante pensa em fazer um curso básico de Libras no início de 2019.

“Todo trabalho dessa equipe fez eu me sentir privilegiada, pois não é sempre que ocorre essa inclusão. E, desde que entrei no curso, o grupo de apoio da universidade sempre se mostrou disposto a ajudar dentro do alcance deles. Existia uma preocupação muito grande para me ajudar realmente a aprender e acho que foi muito produtivo”, finaliza Stefhanie.

Com apoio do governo, acadêmicos de Pedagogia do Parfor se formam em Cruzeiro do Sul

Maria da Glória começou estudar apenas aos 12 anos de idade e concluiu o ensino básico por meio da Educação de Jovens e Adultos (EJA), mas o processo de escolarização dela não parou por aí. Ela foi além, e na noite da última terça-feira, 15, conseguiu concluir mais uma etapa de sua vida: a graduação.

Ela integra o grupo de 150 formandos de Pedagogia do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor), de Cruzeiro do Sul, que se formaram em licenciatura pela Universidade Federal do Acre (Ufac).

“Eu estou realizando o sonho da minha vida, não só meu como de toda minha família, porque, de oito irmãos, eu fui a primeira a cursar uma graduação”, conta, emocionada, a agora licenciada em pedagogia.

Foi para materializar sonhos como os de Glória Maria e de tantos outros acreanos que o Parfor foi criado. No Acre, é a primeira edição do programa, implantado em 2013. E a execução na região só é possível graças à parceria firmada entre o governo do Estado, por meio da Secretaria de Educação e Esporte (SEE), com a Ufac.

“Minha mãe hoje me abraçou e chorou muito. E eu fico muito feliz por saber que até hoje há pessoas que se preocupam com os sonhos de outras, porque a gente sabe que por trás da nossa formação existem várias outras pessoas trabalhando para tornar isso realidade”, reconhece a pedagoga.

Em todo o Estado, o Parfor tem hoje 1.256 acadêmicos, distribuídos nos cinco cursos oferecidos: Pedagogia, Letras, Ciências Biológicas, Geografia e História. Dos 22 municípios acreanos, 19 deles são atendidos pelo programa, cujo objetivo é formar professores que atuam nas redes públicas de ensino, no âmbito municipal e estadual.

Na solenidade de colação de grau das três turmas de pedagogia, Cleide Prudêncio, diretora de Inovação da SEE, ressaltou que a formação dos docentes é uma das principais bandeira do governador Tião Viana, compromissado em qualificar os professores e investir na melhoria da qualidade do ensino público da Amazônia.

“Esta solenidade representa o esforço do governador para formar e investir em pessoas. Desde 2013, temos não só adequado o calendário escolar, mas dado todo o suporte necessário, como apoio financeiro e estrutural, para que os professores pudessem se graduar”, disse.

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Maria da Glória e o marido se formaram juntos – Foto/Mágila Campos

Parfor: uma ferramenta de inclusão social

O reitor da Ufac, Enock Pessoa, lembrou que o Parfor é um programa de inclusão social. “Muitos aqui são os primeiros da família a fazer um curso de nível superior, e muitos outros não teriam essa oportunidade se não fosse por meio de programas como esses”, salienta.

A formatura foi realizada na Quadra Poliesportiva Jader Machado em Cruzeiro do Sul. Além de amigos e familiares dos formandos, participaram da solenidade representantes da SEE, da Ufac e autoridades locais.

O secretário Estadual de Educação e Esporte, Marco Brandão, lembrou que o Parfor busca fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de qualidade, para professores em exercício na rede pública de educação básica, para que estes profissionais possam obter a formação exigida e contribuam para a melhoria da qualidade da educação.

Destacou ainda que o Parfor iniciou no Estado em 2013, mas as formações para os docentes da rede de ensino do Acre, tiveram início ainda na década de 1990, através de outros programas de formações apoiados pelo governo, por meio da SEE.

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