Um legado de modelo de reforma agrária

Estudo da Ufac mostra que implantação dos polos agroflorestais é mais uma política de sucesso em Rio Branco

Fixação do homem à terra e inclusão socioprodutiva é o grande legado desse modelo de reforma agrária. Cerca de 80% das famílias elevaram a renda e melhoraram de vida.

O estudo Distribuição de Renda na Amazônia: Um Estudo dos Polos Agroflorestais em Rio Branco publicado em junho deste ano pelo Departamento de Economia da Universidade Federal do Acre confirma a relevância social e econômica dos polos agroflorestais na capital do Acre. A pesquisa foi realizada em 2016 avaliando informações de 146 famílias dos polos 9 Irmãos, Custódio Freire, Hélio Pimenta, Benfica, Wilson Pinheiro, Dom Joaquim, Geraldo Fleming, Barro Vermelho, Catuaba e Quixadá. O estudo indica substancial melhoria na renda e qualidade de vida das famílias.

O diagnóstico avaliou um intervalo temporal de dez anos com foco nos resultados obtidos nos períodos de 2005/2006 e 2015/2016. Do ponto de vista ambiental, a pesquisa sustenta que as famílias assentadas nos polos vêm cumprindo seu papel de conservação, manutenção e recuperação das áreas nos últimos dez anos, em especial, pelo aumento das capoeiras e florestas. “Muitos anos depois de sua implantação os polos reafirmam sua eficiência como grandes e profundas políticas de inclusão social”, disse a prefeita Socorro Neri.

Parte desses assentamentos foi criada com apoio do Governo do Estado. “Esse modelo de assentamento com suas políticas públicas promoveu a fixação do homem ao campo, aumentou sua renda e o incluiu nas políticas públicas”, resumiu o diretor de Produção da Secretaria Municipal de Agricultura e Floresta de Rio Branco (SAFRA), Jorge Rebolças. Numa síntese da mudança no padrão econômico da maioria dos assentados, 78% dos agricultores aumentaram a renda em uma década.

Pessoas como o ex-seringueiro Plácido Pedro da Silva, beneficiário pioneiro, estão entre os que aproveitaram muito bem a oportunidade de ter um pedaço de terra com características diferentes da reforma agrária convencional. Plácido está há mais de vinte anos no Polo Agroflorestal Custódio Freire, onde toca com a família um grande cultivo de sete diferentes hortaliças e cuja renda mensal, segundo o estudo da Ufac, é “classe A” (média acima de R$3 mil). “Hoje minha família tem carro, moto, a gente sempre conta com um dinheirinho”, relata Plácido.

A Safra ressalta a trajetória dos polos criados como assentamentos em pequenos módulos agrários (terras com 2,5 a 11 hectares no máximo) no ano de 1993 e que prosperaram ao longo desses 25 anos. “A prefeita Socorro Neri tem muita sensibilidade e valoriza essa política”, completou Jorge Rebolças.

Política é referência para o Brasil

especial2Ao longo dos últimos anos, em parte ou totalidade, os assentados foram recebendo políticas públicas de assistência técnica, cursos, kits de produção e criação de pequenos animais, inclusão nos Programas de Habitação Rural (PNHR) e de Aquisição de Alimentos (PAA), infraestrutura de escoamento (apenas dois polos não são pavimentados e todos contam com ajuda de um caminhão da Safra para transporte da produção), um política que inclui mercados públicos modernizados, feiras livres e temáticas (como a Feira do Peixe, por exemplo), algo só visto em alguns Estados.

O professor Raimundo Claudio, doutor em Economia Aplicada e coordenador do Projeto de Análise Socioeconômica dos Sistemas Básicos de Produção Familiar Rural do Estado do Acre (ASPF), conduziu o estudo no âmbito do Departamento de Economia da Ufac e lembra, de acordo com a pesquisa, “os polos Agroflorestais vêm cumprindo sua missão ao longo dos últimos dez anos. Pois, cerca de 20% dos sistemas agroflorestais trabalhados em 2005/2006 eram considerados floresta e capoeira”.

Ainda segundo o estudo, as atividades de Sistemas Agroflorestais (SAFS) foram reduzidas em torno de 93%, dando lugar ao monocultivo de culturas perenes, como é o caso da banana e dos roçados, no caso da mandioca. “Por outro lado, ressalta-se a acentuação da diversificação produtiva nos polos agroflorestais, nos últimos dez anos, em particular da produção de hortaliças, demonstrando maior equilíbrio no uso da terra, característica essencial da agricultura familiar”, diz o estudo.

Oferta de produtos dos polos nos mercados e feiras da capital cresceu até 468%

A produção das famílias do Cinturão Verde de Rio Branco é comercializada no mercado local. Cerca de 70% dos produtores vendem algum tipo de banana, com produção comercializada estimada em torno de 452 toneladas ao ano, e quase 80% comercializam mais de 1 mil tonelada de mandioca e seus derivados (farinha e goma). Além disso, pelo menos 65% das famílias vendem hortaliças no mercado, com mais de 4 milhões de maços comercializados durante uma colheita, por exemplo. Em alguns polos observa-se a pouca vocação para a agricultura impacta a produção, mas a pesquisa mostra que a renda média é dos produtores é de R$3,6 mil no Cinturão Verde.

Nos últimos dez anos, os produtos que mais contribuíram para o aumento da renda bruta foram a banana, com 16% de evolução, e, principalmente, couve e o cheiro verde, com 129% e 468% de crescimento, respectivamente. “Esse aumento ocorreu, notadamente, pelo impacto do Programa de Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) na região”, lembra o doutor Raimundo.

Os números rebatem o argumento de que não há produção agrícola em Rio Branco, apontando uma maior segurança alimentar para a população. Esses produtos estão diariamente disponíveis em 38 feiras livres espalhadas pelos bairros da cidade.

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O que são os Polos Agroflorestais?

Os Polos Agroflorestais foram instalados na década de 1990 pela Prefeitura de Rio Branco na área rural do município que mais tarde ficou conhecida como Cinturão Verde. Essa nova modalidade de assentamento foi criada com base no pressuposto do desenvolvimento sustentável, de forma que garanta a justiça social, a prudência ecológica e eficiência econômica. Assim, um grande diferencial desse modelo de reforma agrária foi a priorização de assentar antigos moradores de seringais e colônias que foram desapropriados e não encontravam ocupações nas cidades –caso do ex-seringueiro Plácido Pedro, morador do Polo Custódio Freire.

Outro fator que destaca os polos agroflorestais dos assentamentos tradicionais é a localização das áreas. Todos os polos fazem parte do Cinturão Verde do município de Rio Branco e, consequentemente, apresentam maior proximidade com o mercado, tanto de escoamento da produção para a comercialização, como a maior facilidade de acesso a insumos e materiais.

A proximidade com a cidade garante também uma infraestrutura mais adequada para o desenvolvimento das famílias, visto a facilidade de manutenção dos ramais, disponibilidade de transporte público em alguns polos, a disponibilização de energia elétrica em todas as áreas.

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